quarta-feira, janeiro 18, 2006

"O mundo será assim: Zapatera"


O mundo será assim: ZAPATERA
O mundo será assim: inseparável.
Zapatera, vou avisando, é apenas uma maneira de aparecer. Zapatera reflete, não é reflexão. Flexa ligeira. Zapatera quer apenas olhar e ser olhada.
No jardim de Zapatera o amor campeia sobre a solidão. Ressonam consecutivamente uma época, como no genes, indicam a luz, o verde, o azul e a amplidão. Tudo fala sem se explicar. Pipocam borboletas e poucas são, de fato, as palavras. Tudo nasce por que tem de ser.
Para você que acredita em novidade, saiba que seu credo está fundamentado em uma ilusão industrial. A novidade alimenta a roda do descarte.
No caminho inverso ao da arte e o do artista nada se separa como querem acreditar os que desvalorizam esse fazer repetitivo e sonolento. Esse fazer que grita, que compreende, que traz em si o que já está feito, o que já foi criado e que apenas se revela através de mãos designadas. “Isso é muito novo! Genial.” diria você meu ilustre desavisado. Meu pequeno bobo. Sujeito-coisa que acredita nos valores de sua ambição. O acostumado a trocar o que lhe incomoda, confundindo o belo com beleza, sente-se bem, jumento! Tu és um verme, por isso segue cantando. O materialismo em moda é contra a urgência em que se efetue também um revisionismo cultural e filosófico. Correndo o risco de se aposentar a ciência em si e a cultura ocidental, o mundo moderno tem que se voltar para a lentidão. Para o lerdo silencioso que passara a existir ou que já existe. Zapatera!
Um corpo de mulher varado. São Sebastião – Mulher – Zapatera, incríveis flechas certeiras. Zapatera!


O ser artístico expressa-se através de sua observância. Muitas vezes o individualismo, ou a experiência de sua existência, cita como exemplo o caminho a seguir. Faço arte ao falar de mim. Apareço para mim, em mim, sobre mim. Todos me verão. Todos, ao observar, se sentiram mais leves. Afinal, estarão se vendo a si e por si próprios.
Olhando sinto-me olhado. Zapatera me acompanha. Viajamos juntos: ela e eu. Suas necessidades são muitas. A minha, de existir a seu lado.


Diante disso, eu então teria que retrucar: Zapatera! Ora, como poderemos alcançar juntamente com outros iniciados a efetividade de uma sublevação na prática da vida, partindo, assim tão amiúde, de plataformas do óbvio retumbante e amparados por teorias de fascículos redigidos por falanges – 64 sintagmas ou 16.384 homens, com certeza uma verdadeiramente multidão de ajumentados - de azabumbados, excepcionalmente treinadas por verdades duvidosas e corriqueiras presumidas.


Me pergunto: “Como?” Como chegar a termo em um cenário de revolução as avessas, onde a exuberância da informação confunde o conhecimento? Onde de tudo se entende mas de nada se compreende? Olhar, pensar, deduzir e enganar. Fala-se em auto estima, perda de peso, transcendência e muito dinheiro, muito além do necessário; da economia e do tempo. Sim! Tudo isso discuti em Zapatera. Foi isso sim que fiz. Choramos juntos, muito, que mais poderíamos ter feito? A arte nessas horas pouco ajuda, ela fica a parte, só olhando. Imóvel, o tempo não a atinge pois é arte. Sei que ela fica triste conosco. É insolúvel esse drama. É insuportável tal visão, pois o céu azul é para todos, mas não o é a comunhão. Zapatera, quem foi que nos convenceu assim? Que logro, que engano, que desfaçatez. O mundo é intocável assim? É claro. Tudo é totalmente errado pois sempre perguntamos o que está acontecendo conosco, com o ser humano. Estamos totalmente convencidos de que está é a verdade absoluta. Agora, possuímos ou somos possuídos? É de nossa natureza acreditar ou os mecanismos nos incita a crermos no estado das coisas como cremos no solido no liquido e no gasoso?

O espiritismo até que poderia ajudar, mas você já viu como esta prática perde força diante da exaltação dos ambientes sofisticados. Você compreende a força que tem uma folhinha de calendário, atrás de uma porta? Sim, é uma questão estética. Como disse o arquiteto morfonhento: “arquitetura é tudo”, e diante dessa afirmação lá se vai as esperanças no espiritismo, pelo menos conceitualmente. Na verdade nunca constatamos nada nem a favor da arquitetura nem do espiritismo. A arte sim. Esta está para nós como o mar para aterra: muitos peixes a serem pescados; muitos vagalhões, muitos abismos inexploráveis. É simplesmente a verdade que se nos apresenta.
Olhando Zapatera a minha frente – mais uma escultura de barro secada na sombra e prestes a ter um molde para que se perpetue – indago: Qual é mesmo a questão?