terça-feira, abril 18, 2006


Mamãe, sacode!
Luiz Carlos Rufo
Ora, vejam! O astrolábio é um instrumento de observação. Usado para se encontrar o angulo do sol, a lua dos planetas ou as estrelas além do horizonte, sua presença poderosa enchia de significados olhos aventureiros. Falar de astros e lembrar seus lábios permitia, ao amante de passagem, descobrir a distância que ia do ponto de partida de suas intenções até ao lugar onde a embarcação de Alzira, musa sempre distante, se encontrava, mas descobria-se, rindo ou chorando, gratuitamente ou em pesados desembolsos, que tudo se relacionava a medição da altura do sol ao meio dia. Mas como entender a disponibilidade de Alzira para com tão diversos e seqüentes amantes se não havia relógio? Era sim, possível! Ela nunca o disse, sabemos, mas era, pois mediam o tempo inteligentemente com ampulhetas, contavam as moedas suadas e capturavam o prazer com ares de tanto faz colhendo resultados pouco rigorosos, claro! Era vantajoso? Hum... todas as seqüências em relação ao quadrante, havia sempre um vento benfazejo não só porque era mais fácil trabalhar à luz do dia, igualmente para com a lua, como pelo fato de a Estrela Polar não ser visível no hemisfério sul. Este fato obstruía muitas reflexões dos pretendentes, dos presentes e dos que se iam, e de fato nada acrescentavam aos distraimentos e concentrações dos sentidos de Alzira. Ela costumava banhar-se na lagoa como os patos e tinha o gosto em feitios solenes, pompa e suntuosidade para com o ato de pentear os cabelos para trás para que ficassem colados e rentes a cabeça, brilhando, cheirando e seus pensamentos alados. Sua boca era linda. Alzira. Mulher que media, antecedia e calculava. O automóvel acelerava seguro e poderoso na noite clara do encontro, seu perfume era “touiours moi”, seus olhos tinham fantasias, seus cílios fragrância: era possível cheirá-los à distância. Tudo lá fora passava com velocidade por sua janela, por sua vez a minha tudo parecia que era calmo como se estivesse deslizando, suave, sem tempo para chegar. O astrolábio também podia ser usado para se determinar a altura das montanhas. Isso era sabido? Naquela noite, uma outra noite, claro, de descanso e pés descalços seu cavalo, o Azulado, tinha olhos fixos em algo além. Sua grossa crina sobre a testa brilhava com a lua fixa na distância, escondendo a marca de uma rala estrela em sua testa. Quem pode ter em sua caixa de jóias algo tão belo quanto um cavalo a não ser as alziras? Recordo ter presenciado em uma dessas ricas caixas quatro peças: maçã, figo, pêra e um voluptuoso morango todas elas, as peças, enfileiradas por tamanho e presas a um cordão de quatro voltas todo em ouro branco que vale toda a felicidade. Alzira era uma mulher sem cartografia definida, sem navegação segura, sem norte, sem estrelas, sem sinais de alerta ou de vida. Uma noite escura esperando o alvorecer, o som do galo, a magia da cor laranja invadindo, de baixo para cima, a escuridão que se afasta empurrada. Era mulher, assim memso, e muito mais, muitas faltas e ausências compensadas pelas medições. A cama de Alzira tinha muitos travesseiros e acolchoados coloridos para não acolher. A cama era um tipo de caixote inesquecível num quarto imenso, alto e fresco. Tão alto que podia comportar um vaso grande com uma árvore adulta. Ao fundo perto da janela que nascia do chão indo ao teto, outra cama menor onde podia, Alzira, admirar, nua, sem ser admirada, sua outra cama vazia com os lençóis remexidos e lembranças de muitas nudezas. Alzira sabia que era rica e diferente da maioria das alziras do mundo. Saber, não bastava? Quem poderia ter em sua caixa de jóias um cordão com maçã, um figo, uma pêra e um morango em ouro e prata? Alzira sabia que era rica e igual a maioria das alziras do mundo. Sem questões! Quem poderia ter em sua caixa de jóias um cordão com maçã, um figo, uma pêra e um morango em porcelana? Avistou-se por entre pedras um mar azul anil profundo e transparente, em barrado de azulejos, de águas nervosamente agitadas. A espuma corria por cima do bordejado das ondas e era composta por infinitos milheiros de pequeníssimos diamantes que valem toda a felicidade de Alzira.

3 Comments:

Blogger Luna said...

Alzira não insira pensamentos "Mulher que media, antecedia e calculava" que Amélia que nada Alzira que era mulher de verdade... Rufo rufaste os tambores ao escrever... brilhante como os diamantes dela... beijos polares da Luna

8:14 PM  
Anonymous Anônimo said...

Grande,

Faz tempo que não te ouvia. Continuas o mesmo velho e bom Rufo de sempre com teus textos ricos e suculentos.
Mas, sinto que escrita deixou de ser aquela verborragia contumaz e compulsiva de antanho. Sinal dos tempos ? Novos desafios na Árvore ?
Seja o que for, vamos nós !

Abração.

2:22 PM  
Anonymous Anônimo said...

Rufo

Este texto é pra matar ou pra viver? que lirismo!!!
Chico: suculento lirismo!
Amplexos,

10:28 AM  

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