domingo, setembro 03, 2006
O encontro de um pé com outro.
Andar é bom. Andar faz o pensamento ser leve. Andar lembra pé. E pé lembra muitas outras coisas. A propósito, o que René Magritte, pintor belga, nascido em 1898, bastante surrealista por sinal - de fato um surrealista, dá pra ver que era - estava fazendo, esse senhor, na Rua José Elias, Alto da Lapa, na sexta à noite? Forçando uma relação vulgarmente considerada indissolúvel? Seria para ser mais facilmente classificado como um pensador surrealista? Acredito que sim, pois, creio eu, coisas visíveis podem ser invisíveis, as vezes, hum – que inquietação. Contudo sabemos que estava lá. De fato. Sei que ele preparava uma das suas singulares idéias para telas pintadas na escuridão da noite e foi surpreendido, sem prévio aviso, por mim, um alegre transeunte apoiado pelos pés. Por mim que sou, vá lá, um homem atento e não menos genial. Falando francamente não posso dizer tê-lo visto, assim de frente, apenas com um pouco de obliqüidade. Foi apenas um vulto fugidio que, oras oras, me confundo e ensejo um momento propício que seria apenas o ônibus passando, não importa. O que oportunamente vejo é que os sapatos que, ele o René, usaria na tela ficaram ali, no passeio, quase encostados ao muro que separa o jardim do prédio de moradias da rua movimentada, na calçada perpendicular a via anteriormente mencionada. Rapidamente fotografei o cenário. Fixei meu olhar sobre a cena. Sei que ele não teve como concluir a obra assim tão rápido como eu a concluiria, pois o trabalho é sempre complexo e obriga ao raciocínio, à interpretação e ao estudo. Não percebi sua real idéia, mas os sapatos borrados com cal estavam lá e eu os seqüestrei. Não os sapatos em si mas a idéia de sapatos com cal. Trouxe-as comigo e para mim. Sapatos com cal na ponta chamam-se Magritte, pois ele sempre afirmou fazer uso da pintura com o objetivo de tornar visíveis os seus pensamentos. Como os quadros de Magritte, esses sapatos não podem ser simplesmente vistos. Precisam ser pensados. Todo o surrealismo tem uma fatia de loucura que revela toda uma genialidade. Magritte é genial portanto, tenho como provar, sei que o encontrei na José Elias. Uma cena noturna encobre o par de sapatos e nos anima a olhar, reconhecendo, a natureza surreal desta cena aparentemente realista. René estava lá, eu estava lá e os sapatos também.
2 Comments:
Tives raras experiências místicas, o que me entristece. Deus não me deu o dom destas viagens, porém ELE me deu a graça de ter tido contato com um semi deus. Vc é lindo e está tatuado no meu coração. Saiba que tenho muita admiração pela sua pessoa e pela sua aarte.
CAPITU
Onde está René? Esta pergunta permeia a história do surrealismo.
Nós da academia o procuramos e contestamos seus eventos inusitados.
Que a história confirme que você, Rufo, tenha topado com ele na tal José Elias, que diga-se de passagem um nome bastante surreal.
Parabéns!!!!
Evandro de Castro
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